sábado, 15 de fevereiro de 2014

O Conselheiro do Crime


Há alguns meses, ao sair da sala de cinema e ainda sem uma análise elaborada, pensei que O Conselheiro do Crime (The Counselour, 2013) fosse fazer um estardalhaço no público sedento por roteiros ousados e personagens marcantes, como também imaginei que haveria indicações para o Golden Globe e para o Oscar... Não aconteceu nem uma coisa e nem outra.  Até a nota no IMDb está baixa. 

Dirigido pelo voraz Ridley Scott (Blade Runner, Alien, Prometheus) e roteirizado por Cormac McCarthy, vencedor do Pulitzer e autor do romance que deu origem ao quase clássico Onde Os Francos Não Têm Vez (No Country for Old Men, 2007), o longa tinha muito para se firmar como uma das melhores produções do ano. Além disso, a produção contou com um elenco de astros de Hollywood: Michael Fassbender, Javier Bardem, Cameron Diaz, Penélope Cruz e Brad Pitt, assim como com atores de inegável talento, como Bruno Ganz, Toby Kebbel, John Leguizamo (em participação não creditada) e Rosie Perez (num papel curto, mas marcante).

Poucas vezes vimos uma Cameron Diaz tão visceral e convincente. Sua personagem certamente entrará para galeria de mulheres extraordinárias, devassas, ousadas e vagabundas (opa!) do cinema.


O longa mostra a trajetória de um advogado tranquilo (Michael Fassbender, que é o tempo todo chamado de Counselor), apaixonado por sua noiva virtuosa (Penélope Cruz - recatada e sensual), que decide entrar num arriscado negócio de tráfico de drogas, pensando tão somente na fortuna que iria ganhar. Sem avaliar todas as variáveis possíveis daquele jogo, o personagem de Fassbender, apesar de alertado por um experiente traficante (um Brad Pitt estereotipado e dispensável), aceita fazer parte do plano de entrada de cocaína pela fronteira entre o México e os Estados Unidos, pensando que poderia tão somente ganhar uma bolada e voltar para sua vida equilibrada e romântica.

Uma falha na execução da jogada e uma infeliz coincidência jurídica colocam o nobre conselheiro (e companhia limitada) na mira dos furiosos grandões do tráfico. Somente ante o desespero dos comparsas é que o ingênuo advogado percebe que aquele dinheiro não viria tão fácil e que era tarde demais para sair ileso daquele universo cruel e sanguinário. A até então segura transação se torna um inferno para o protagonista, virando de ponta-cabeça seu trabalho, seu relacionamento amoroso e sua vida social. Amedrontado e impotente, ele passa a correr desenfreadamente para entender o funcionamento do esquema de queima de arquivo. A transformação do homem elegante num ser atabalhoado é apresentada com coerência e boa dose de tensão, tendo sido adicionado elementos que aplicaram com afinco o mesmo sentimento no espectador. Sem dúvida, um ótimo trabalho do ator alemão.


Não por acaso (em virtude do roteiro de McCarthy), a estrutura e os personagens do filme em muito se assemelham aos mesmos itens de Onde Os Fracos Não Têm Vez, não obtendo, contudo, o excelente resultado do longa dirigido pelos irmãos Joel e Ethan Coen. É aquela história de um homem que se aventura em uma  ação de risco e que só percebe não ser tão forte o bastante no meio da jornada. Nos dois casos, eles foram movidos pela ambição de ganhar uma fortuna rápido. "Eu faço algo errado, ganho muito dinheiro e pulo fora". Simples assim. Este é o pensamento dos ingênuos seduzidos pelo poder temporário.  Logo no início do filme, temos uma caça apreciada pelo casal formado por Diaz e Bardem (um par exótico, colorido e despudorado), que guarda a mesma estética e função do abatimento mostrado no prólogo de Onde Os Fracos Não Têm Vez. Uma alusão ao que seria mostrado no filme: o caçador pode virar a caça.


No decorrer do filme, uma série de personagens surgem e se mostram muito mais que meras aparições, conferindo destaque e cenas de tirar o fôlego.

E por que o longa não deu certo?

A ótima fotografia, o brilhante texto e o desempenho eficiente dos atores não garantiram que o conjunto ficasse arrebatador. Talvez boa parte dos entraves tenham se concentrado nos longos diálogos do filme, que, embora interessantes (que contradição!), ficaram desconexos no contexto em que foram inseridos. Como por exemplo, o que o relato de Bardem sobre a performance pornográfica da personagem de Cameron Diaz tem a ver com o assunto tratado inicialmente pelo Conselheiro? Ao final, ele (Bardem) ainda admite que a confidência não tinha nada a ver mesmo com a questão da confiança (???). Acho que é mais ou menos isso. Não obstante, o histriônico personagem de Bardem é o que dispara as mais divertidas e inspiradas frases durante a projeção.


A conversa ao telefone (com o Conselheiro aos prantos e acuado dentro do carro) e o irônico discurso de Diaz numa cena de impacto são apenas dois exemplares da instauração segura produzida entre o roteiro e a competência dos atores. É uma pena que a concatenação de cenas tenha sido infeliz.

Apesar das considerações, pelo roteiro, pela fotografia e pelos atores, eu recomendo que o filme seja visto (e talvez até revisto), pois pessoas interessantes e texto bem cuidado nem sempre têm dado as caras no cinemão.






por Dean Norris: http://c1n.tv/tag/dean-norris/



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