sábado, 26 de setembro de 2009

Respiração...

Boca a Boca

Assistindo hoje, sem nenhuma pretensão, ao filme "Busca Explosiva" (The Marine, 2006), deparei-me com uma cena que, mais uma vez, confirmou em mim o que é o mais bacana no cinema: os bons atores, ou melhor, os atores de verdade.

Eu já consegui me entreter com filmes feitos com dublês de atores, cantores, apresentadores, picaretas e afins, e até achei alguns muito bons, talvez por serem honestos em se desafiar e em copiar formas de interpretação. Eu considero muito válido quando alguém admite que fez algo e não se levou a sério.
Pois bem, o filme em questão tem como ator principal o prestigiado John Cena, um astro de luta-livre da World Wrestling Entertainment (WWE). A produção capricha nas cenas de ação, exibindo lutas bem coreografadas e efeitos especiais arrojados. Não há investimento marcante em cenas dramáticas, sendo exatamente isso que eu aprecio nessas horas. Não tentem extrair de um determinado ator algo que é visível não ser de domínio do próprio, mas faça generoso uso daquilo que ele provavelmente domina. É só não abusar, certo?

Até aí tudo bem. Porém, os bons filmes de ação, até esses com objetivo de promoção de astros e de arrecadação comercial, precisam de uma cena, mínima sequer, que mostre o herói um pouco próximo da nossa realidade, ou seja, com sentimentos humanos, e é nesse ponto que nossa observação mordaz entra em ação (sem trocadilhos).

Uma das cenas do filme me remeteu ao ótimo "O Segredo do Abismo" (Abysm, 1989), dirigido por James Cameron.
Eu sei que é injusta a comparação, haja vista que o casal protagonista do filme mais antigo era composto por ninguém menos que o excelente Ed Harris e a competente Mary Elizabeth Mastrantonio.

É aquele revisitado momento em que o herói salva a mocinha à beira da morte e mostra emoção por pensar que ele não foi bom o bastante por não ter agido no tempo certo.

Nos dois filmes, a mocinha afoga e o herói mergulha para resgatá-la. Aparentemente sem vida, o seu par inicia uma desesperada massagem cardio-respiratória com aquelas comoventes respirações boca a boca.

Kelly Carlson, a estrela de "Busca Explosiva", é, sem dúvida, um mulherão e tem outro importante atributo: carisma. Mas como a garota resgatada das águas e sem vida, ela ficou uma ótima modelo. Também, contracenando com o fortão que faz caras legais nas horas erradas, não dava para a atriz seguir a linha de uma Susan Sarandon (bom, mesmo se quisesse...). Linda e suave, enquanto Cena procura nos passar seu desespero, ela permaneceu impecável, parecendo um anjo fazendo pose para uma revista de moda.
Kelly Carlson e John Cena, o casal protagonista de "Busca Explosiva"

Em "O Segredo do Abismo", a cena em que a personagem de Mastrantonio afoga e é resgatada pelo personagem de Ed Harris é de uma emoção tão sincera que ficou registrada na minha mente e ressurge toda vez que vejo cenas de afogamento em filmes. Mary Elizabeth é trazida à tona e mostra uma face sem vida, opaca, olhos inertes, lábios entreabertos. Não era só um efeito de maquiagem. A atriz usou seu potencial e esqueceu o glamour para nos passar uma idéia de que era bem provável que sua personagem estivesse realmente morta.

Ed Harris, por sua vez, com seus expressivos olhos que não se perdem em momento algum, vive com intensidade o drama daquele homem desesperado por salvar a mulher amada. Quando ele, um machão convicto, sem pudor algum, rasga a blusa de sua namorada na frente de outros homens, deixando os belos seios da atriz à mostra, a gente acredita que ele estava agindo no descontrole, já sem saber o que fazer, principalmente nos momentos em que dá socos violentos no peito da garota, numa tentativa de trazê-la de volta ou de, talvez, exteriorizar toda sua indignação com aquele fato.

Apesar dos termos, os dois filmes são bons no que se propõem, e a aprovação de um ou de outro dependerá do que você procura na hora de assisti-los.

As pessoas precisam aprender a gostar das diferentes formas de elaboração. Acreditem, depois que passei a exercitar esse lado, assistir a filmes se tornou uma rotina ainda mais agradável.

Vamos repetir algo já escrito em outras postagens? Seres-humanos especiais sempre gostarão de ver outros seres-humanos especiais. Não bastam os efeitos, não basta a era digital, não bastam os investimentos milionários, se não houver pessoas eficientemente humanas no processo, ele não serve.
Mary Elizabeth Mastrantonio e Ed Harris em cena de "O Segredo do Abismo".

domingo, 13 de setembro de 2009

A Órfã

Não é possível comentar "A Órfã" (Orphan, 2009) sem destacar o ótimo trabalho da garota que dá o título ao filme. Alguns críticos compararam o trabalho da bonitinha Isabelle Fuhrman àqueles desempenhados por Kirsten Dunst e Natalie Portman em "Entrevista com o Vampiro" (Interview with the Vampire, 1994) e "O Profissional" (Léon, 1994), respectivamente. Ambas atrizes tinham apenas 12 anos à época dessas produções e assumiram papéis com certa complexidade para uma criança. O mesmo ocorreu com a pequena Isabelle Fuhrman.

Na trama, ela é Esther, uma garota órfã de 9 anos que consegue conquistar a atenção de um casal aparentemente feliz. Mostrando-se prendada, muito inteligente e de um recato fora do comum, a pequena Esther se encaixa bem no vazio que o casal carrega após a morte prematura da terceira filha legítima deles. Sendo adotada e tendo todas as garantias de que seria tratada como alguém da família, Esther começa a mostrar um raciocínio maquiavélico, ameaçandos os irmãozinhos, enganando o pai e descontrolando a instável mãe.


Atualmente com 12 anos (ela tinha 11 durante as gravações), a garota deve ter sido muito bem instruída para sair de seu universo infantil e encarnar uma figura malévola. Não é sempre que nos deparamos com um ser tão perverso como Esther em produções com parte do elenco infantil.

Também merecem destaque a charmosa Vera Farmiga, de "Os Infiltrados" (The Departed, 2006), no papel da mãe dedicada e ex-alcóolatra que, exatamente por essa condição, é desacreditada ao perceber o comportamento sinistro da menina, e a estreante Aryana Engineer, que interpreta a encantadora Max, uma garotinha surda e muda.

Peter Sarsgaard, de "A Chave Mestra" (The Skeleton Key, 2005), e a sempre agradável CCH Ponder, a Brenda de "Bagdad Cafe" (Out of Rosenheim, 1987), completam o time de atores da trama central e defendem seus papéis com afinco e credibilidade.

Existe uma certa previsibilidade na trama, pois os indícios do segredo não são elaborados como deveriam, deixando situações que poderiam passar sem grande evidência (aquelas dicas que nos são jogadas durante o filme, mas que não percebemos tratar-se de uma grande pista) como um claro sinal de parte do quebra-cabeça. Dessa forma, os espectadores mais atentos descobrem antes do terceiro ato o que é aquela garotinha esquisita.
Mas até isso não compromete o entretenimento, posto que, apesar das revelações de impacto mediano, o desempenho do elenco e a montagem das cenas finais garantem um filme acima da média, com direitos a muitos sustos e uma tensão poucas vezes vistas no cinema.

Ao final, depois da garotinha ser submetida a cenas tão intensas, constatamos que trata-se de uma pequena estrela. É muito bom vê-la em entrevistas e nos eventos de divulgação do longa. Dessa maneira, confirmamos que ela é uma garota normal, graciosa e muito inteligente.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Arraste-me para o Inferno

Sam Raimi, o diretor da trilogia arrasa-quarteirão Spider-Man, deu um tempo nas incursões milionárias de Hollywood para produzir um filme mais próximo às suas origens no cinema.Com "Arraste-me para o Inferno" (Drag me to Hell, 2009), Raimi reviveu o gênero que o lançou, mostrando que sabe como ninguém assustar e fazer o público rir de si mesmo.

Foi em filmes nesse estilo que o diretor chamou a atenção dos espertos produtores de cinema, uma vez que demonstrou sua habilidade em apresentar histórias elétricas, efeitos impressionantes e uma expressiva criatividade.
A trilogia Evil Dead [A Morte do Demônio (The Evil Dead, 1981), Uma Noite Alucinante (Evil Dead 2, 1987) e Uma Noite Alucinante 3 (Army of Darkness, 1992)], todos protagonizados pelo nota 10 Bruce Campbell (foto abaixo), foi uma paixão do diretor, tanto que é bem provável que ele promova um remake do primeiro filme. E foi com esses filmes, assustadoramente trashs, que Raimi impôs seu formato de câmera rápida, movimentos loucos e cenas de impacto, mas com uma grande vantagem: o público não era enganado e não ficava naquele incômodo de não conseguir compreender o que estava sendo exibido, como acontece na infeliz franquia Transformers.
Com "Darkman - Vingança Sem Rosto" (Darkman, 1990), ele provou que podia sair do horror divertido e propor aventuras mais sérias (se é que existe isso no cinema...).

Depois de não deixar dúvidas sobre o seu talento, cheio de fama e prestígio, o grande diretor resolveu produzir um filme parecido com aqueles que o lançaram, com a diferença de ter muito dinheiro pra fazer bacana.
Não foi exatamente o dinheiro que garantiu o bom filme, posto que Raimi já conseguiu a façanha de criar pequenos clássicos nas suas épocas das vacas magras.

Partindo de um argumento simples, moça ingênua destrata uma velha que lança-lhe uma maldição, Raimi conseguiu nos envolver num filme que prende a atenção do início ao fim.

Não é nenhum clássico, tampouco um filme memorável, mas é certo de que alguns de seus momentos serão incorporados à galeria de cenas antológicas de filmes de terror. Um bom exemplo é a eletrizante cena do confronto físico da protagonista com a velha horrenda dentro de um automóvel.
O diretor queria a gracinha da Ellen Page (Juno) como a atriz principal, mas conflitos de agendas fizeram a garota recusar o filme. Sorte nossa que tivemos o prazer de desfrutar da ótima performance da bonitinha Alison Lohman, de "Peixe Grande" (Big Fish, 2003) e "Os Vigaristas" (Matchstick Men, 2003), que foi escalada para assumir o posto da heroína.
Ao seu lado, revelando-se um ator que está melhorando a cada trabalho, temos o equilibrado Justin Long, que encarna um sujeito comum, sem grandes atrativos, mas verdadeiramente convincente.
Apesar do bom par central, o destaque mesmo fica por conta da composição tresloucada de Lorna Raver, que interpreta uma velha feia e furiosa capaz de arrepiar qualquer bom cristão.
O filme é claramente armado pra te pregar grandes sustos, empregando um intervalo incômodo antes das cenas de impacto. Aquele silêncio, aquela pausa, aquele alívio, mas só para o personagem, pois nós, espertos espectadores de filmes de terror, sabemos bem que é só um preparativo para um grande estrondo. O pior é que sabemos exatamente que isso irá acontecer, nos preparamos e assustamos assim mesmo.
Outro trunfo do filme é a economia em efeitos especiais de computador, algo que tem se tornado o único recurso de certas produções. Talvez por respeito às suas produções iniciais, ou por gosto próprio, Sam Raimi optou pelos jogos mecânicos para nos mostrar o visual assustador do longa.

Existe algo abominável no filme, uma coisa que me recuso a dar pistas, mas que me fez entender as críticas agressivas que "Arraste-me para o Inferno" sofreu por certa parte do grande público. Confesso que eu também me senti traído, embora muita coisa indicou que aquela situação iria ocorrer, mas ele (o diretor) bem que podia ter nos enganado pelo contrário. Não estão entendendo nada, não é? Pois é, é porque eu não quero ser claro mesmo.

Há possibilidade do enredo cruel nos deixar aflitos com o rumos dos personagens, mesmo diante da obviedade da fantasia. Eu já escrevi em outras postagens que não tenho medo de filmes de terror, somente "A Vingança do Diabo" me impressionou até hoje, é nem é um filme de grande prestígio. Com relação ao "Arraste-me para o Inferno", eu precisei buscar entrevistas com o elenco e fotos dos atores como "gente normal" para poder abrandar meu insconsciente. Eu fiquei realmente com pena daquelas pessoas... Que bom vê-los de dia e sorridentes em eventos de divulgação do filme. Vejam o semblante agradável de Lorna Raver (à esquerda) e Alison Lohman (à direita) na foto abaixo. Parecem a velha insana e a mocinha assustada do filme?
Esqueçam esse detalhe e confiram o filme, preferencialmente no cinema, e aproveitem esse intervalo de Raimi nas grandes produções, pois não sabemos se os grandes estúdios irão liberá-lo novamente para essas travessuras.