sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Contatos de Quarto Grau

Criatividade, oportunismo ou picaretagem?

Quando eu descobri que alguns filmes se apresentavam como baseados em fatos reais e que, na realidade, eram obras puramente fictícias, fiquei indignado e cheguei a achar que aquilo era um desrespeito com o espectador.
Bobagem. Não é nada disso. No cinema, enganar é uma das atrações. Um dos grandes trunfos da obra cinematográfica é causar sensações, e muitos produtores não medem esforços para criar expressivos debates acerca de seus filmes. E isso é super válido, pois a função do cinema é, essencialmente, o entretenimento, não importando que se rogue para uma tremenda fantasia disfarçada de verdade.

Ademais, as pessoas que gostam de cinema adoram mesmo uma boa surpresa.
A Bruxa de Blair (The Blair Witch Project, 1999), Mamãe é de Morte (Serial Mom, 1994), Os Estranhos (The Strangers, 2008) e o recente Atividade Paranormal (Paranormal Activity) fizeram isso. À exceção do medíocre "Os Estranhos", os outros filmes se deram bem junto ao público e à crítica (se não foram um sucesso de bilheteria, ao menos despertaram atenções), e, no caso de Mamãe é de Morte, até serviu para potencializar o deboche divertido que é o filme.


Contatos de Quarto Grau (The Fourth Kind, 2009) foi pelo mesmo caminho, mas abusou um pouco mais do que poderia. Senão vejamos:

Seguindo a linha dos demais ao difundir informações pela internet, plantar falsos registros em jornais e se auto declarar verídico, o filme despertou interesse em parte do público que queria conferir a autenticidade daquela história ou, no mínimo, verificar se o longa seria realmente impressionante.

Antes de ir ao cinema, evitei buscar todo e qualquer tipo de informação para poder avaliar o que meu grande amigo Gustavo Campos sentiu para ter se impressionado com o filme.
Contatos de Quarto Grau já começa com um recurso ousado. Utilizando-se um cenário em tom fortemente claro, temos a estrela Milla Jovovich entrando em cena e se apresentando como ela mesma. Ela nos conta que faria o papel de uma tal de Abigail Tyler e passa algumas explicações sobre a estrutura do filme. De forma convincente e numa montagem instigante, Jovovich relata para o público, numa expressão séria e charmosa, como foram inseridos trechos de cenas reais durante a projeção e, por fim, nos faz um alerta de que estávamos prestes a assistir algo realmente perturbador.

Infelizmente, mesmo tendo usado seu nome real, Milla Jovovich estava representando.

Após a apresentação, há um corte para a cena que mostra a "verídica" Abigail "Abbey" Tyler, o que nos causa uma certa estranheza, pois a mulher não tem nenhum tipo de atrativos (para não ser deselegante), enquanto Milla havia aparecido como ela realmente é... Linda!
A partir de então, somos conduzidos a uma história interessante que, entre o primeiro e parte do segundo ato, eleva o suspense a cada cena, cometendo somente alguns deslizes no ritmo, e que consegue despertar nossa curiosidade.

A personagem central, a psicóloga Abbey Tyler, é uma mulher que teve o marido assassinado em circunstâncias misteriosas e que estava no Alasca com seus dois filhos. Fazendo seu trabalho, ela percebe certas semelhanças nos dizeres de seus pacientes, o que a faz querer investigar mais a fundo a razão daquelas insônias e desordens emocionais evidentes na região.

Citando elementos simples, o filme ganha força quando começamos a imaginar que as coisas sutis de nosso dia a dia podem ser os sinais obscuros que o filme pretende propor.


Ao longo da projeção, sabemos que Nome, a cidade no Alasca, tem um histórico de desaparecimentos e de suicídios, e isso já é o bastante para que fiquemos incomodados com o destino provável daqueles personagens.

Pois é, até aí tudo bem. Eu cheguei a pensar que, mesmo desconfiando, iria ser abduzido por aquela narrativa competente. Mas a história descambou a partir de um certo ponto, ficando difícil de acreditar que aquilo tudo tenha uma ligação, ainda que mínima, com a verdade.

Não vejo problema algum em enganações do cinema, desde que o arranjo mexa com o inconsciente do expectador e o deixe refletindo sobre os elementos que o incomodaram. A Bruxa de Blair teve essa proeza, embora muitos não consigam admitir isso.

Talvez, muito talvez, o pecado original de Contatos de Quarto Grau tenha sido exatamente exagerar na dose. A partir do terceiro ato, muitas são as ações e os materiais que são jogados no público para tentar legitimar aquela história.

O uso da conveniência chega a ser irritante. Todos sabemos que certos contatos inviabilizam o funcionamento de itens magnéticos, mas se valer desse fato para nos mostrar pequenos trechos rápidos e distorcidos só para nos angustiar, soa como uma solução puramente roteirística, manchando a veracidade dos registros. Seria mais honesto se nos mostrassem um poltergeist total.

"Escutem, idiotas, não tem imagem! Não foi possível capturar nada mesmo! Não gravou, certo?" O problema é que a psicopata, opa, eu quis dizer a psicóloga Abigail Tyler ficou o tempo todo afirmando que não havia sido possível gravar nada (repetindo: gravar nada), mas o filme nos mostrava que tinha imagem sim. O que era aquilo? Material remasterizado?

E o policial que saiu do carro? Narrou o que estava acontecendo com uma dicção incrível, digna de quem fez aula de canto, e deu detalhes que faria qualquer roteirista corar de vergonha. E ele também falou para o chefão furioso (o ótimo Will Patton) que a câmera do carro não registrou nada, mas, num determinado momento, o filme nos mostra que era possível visualizar uma coisa muito interessante. Sim, aquilo era o nada!

O policial e a Abigail falavam que as câmeras não registraram as imagens. Ao mostrar imagens reais de arquivo, o filme nos dá uma idéia muito razoável do que aconteceu no quarto do rapaz e no alto da casa. Estava escrito na tela que eram imagens reais de arquivo. Então por que a "psica" e o policial preferiram passar por mentirosos? A intenção era guardar as imagens para que elas fossem inéditas no cinema? Conta outra...Uma sequência de cenas importantes combinadas com a narração da tenebrosa verdadeira Abbey Tyler também se revela como uma montagem tão bem feita que só ficaria daquela forma se fosse obra das inteligentes edições cinematográficas, mas não na vida real. O que de fato é.

Bom, pode ter funcionado para alguns, mas eu, sinceramente, não consegui me impressionar. Os elementos que citei (aqueles da parte inicial do filme) perderam força quando a história se desenvolveu e mostrou que eles eram... Elementos?

Querem um bom motivo para assistir ao filme? Milla Jovovich.

sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

Pinky Dinky Doo

Há alguns anos, estive observando que meu sobrinho Álvaro gostava de assistir a um desenho animado que, naquela época, passava somente no Discovery Kids e, hoje, também é transmitido pela TV Cultura.

O que me chamou a atenção era que a animação parecia uns recortes de revistas manipulados em cima de uma fotografia do mundo real. Interessado em desvendar o que aquelas imagens tinham para despertar a atenção de uma criança de dois anos, resolvi acompanhar alguns episódios (parece pretexto para quem não quer admitir que assiste a desenhos infantis).

Tratava-se do educativo Pinky Dinky Doo, uma pequena preciosidade da TV que apresenta imagens coloridas e bem próximas daquelas que despertam o olhar de uma criança. O título é o nome da personagem central, uma garotinha muito esperta (um pouco convencida também) que, diante de qualquer tipo de problema, arruma uma história criativa para solucionar as questões, pelo menos para o universo infantil em que ela está inserida. E, por meio dessas histórias, ela desperta no irmãozinho de quatro anos, e no público que a assiste, uma maneira lúdica e agradável de se raciocinar.


Desenhando com giz dentro de sua caixa mágica, ela conta com a ajuda de seu porquinho da índia para narrar situações que servem para explicar certas palavras e propor jogos interativos.

Para quem não convive com crianças, o desenho animado parece uma grande bobagem, mas, se formos comparar o que são os problemas para a menina com as vicissitudes de nossas vidas, podemos até visualizar nossa visão infantil necessária para lidar com os fatos.

O desenho foi criado por Jim Jinkins, o mesmo do carismático Doug e do programa infantil Sesame Street (Vila Sésamo, aqui no Brasil), ou seja, a função cultural e educativa é a marca do desenho.

Pinky Dinky Doo me fez lembrar, em parte, das aventuras da Luluzinha, uma personagem de história em quadrinhos que criou uma marca ao dar nome àquelas reuniões só para mulheres, o famoso Clube da Luluzinha. Criada em 1935 por Marjorie Henderson Buell, essa pequenina feminista também tinha seus momentos de garota orientadora ao inventar histórias para Alvinho, garotinho traquina da turma, de forma a fazer com que o menino ficasse um pouco mais quieto. Quando estiverem com vontade de revisitar o raciocínio interior e infantil que existe dentro de cada um de nós, tentem assistir às aventuras narradas pela Pinky Dinky Doo, ou comprem algum almanaque da Luluzinha. Boa oportunidade para conhecer a garota, o Alvinho, o Bolinha, a Glorinha, a Aninha, o Raposo, o Plínio e todos os outros componentes de uma turma divertida ao extremo.