sábado, 1 de outubro de 2016

O Abutre (Nightcrawler, 2014)



Poucas vezes temos a oportunidade de ver protagonistas tão amorais e tão sem escrúpulos no cinema, e o pior, terminar por gostar deles. O aparentemente ingênuo Louis Bloom nos dá uma lição de como pegar uma ideia de forma oportunista, desenvolvê-la com coragem e se tornar uma referência no produto, sem pudor algum, sem regras morais, sem piedade...

Logo na primeira cena, percebemos que Louis é um homem estranho e deslocado no mundo. Apesar de parecer um sujeito abobalhado, ele nos surpreende ao atacar um vigilante desavisado para tão somente roubar o relógio bacana do sujeito. Depois disso, é revelado que ele pode ir além, tendo a capacidade de enfrentar e coagir pessoas espertas por meio de sua desenvoltura com as palavras e de sua capacidade de observar os pontos fracos dos outros de forma sutil e ardilosa.

Por fim, essa impressão vai por água abaixo quando temos a certeza de que o personagem é um canalha bem articulado.



Em O Abutre (Nightcrawler, 2014), o ótimo Jake Gyllenhaal compõe mais um personagem brilhante para sua galeria de tipos fora do comum. Assim como em Donnie Darko (2001), o ator tomou o cuidado de manter seus olhos sempre bem abertos, sem piscar, sem desviar a visão de seu foco, tudo para potencializar o modo soturno da caracterização. Complementando a composição, por conta própria, Gyllenhaal decidiu emagrecer 10 quilos e usar um cabelo do tipo corte-me, por favor.

No primeiro ato do longa, mesmo sob o impacto da primeira cena, persiste a ideia de que estamos diante de um ladrão medíocre que quer um emprego e construir um nome, mas que ainda não se deu bem por não estar no lugar certo, na hora certa, para a sacada de sua vida. Não obstante a consciência de que poderia parecer patético, ele não se constrange ao pedir um emprego para o dono da empresa de fachada que compra seus itens roubados. Quem vai dar um trabalho a um um ladrão pé-de-chinelo confesso? Ele parece mesmo um estúpido...

Louis Bloom aprendeu grande parte de seu discurso impecável em pesquisas na internet, o que seria algo até plausível para um homem deslocado, desde que ele fizesse uso disso somente naquelas conversas introdutórias e superficiais. O problema é que ele tem a capacidade de manter essa mesma tática memorizada ao longo de uma relação, revelando, assim, seu lado sociopata. Psicótico, Bloom é um autodidata que planeja suas falas e que arma o declínio de seus opositores sem se preocupar com a gravidade do resultado. Um perigo!



Dirigindo noite adentro, Louis se depara com um grave acidente de carro e observa algumas equipes independentes que gravam aqueles momentos funestos para vender às emissoras de TV.  É aí que surge a ideia de comprar uma câmera (também trocando material de roubo), usar um rádio receptor e captar os alertas policiais para chegar antes aos locais dos desastres e dos assassinatos.


Meio descontrolado a princípio, ele arruma encrenca com pessoas próximas às vítimas, com policiais que estranham seu jeitão atabalhoado e com profissionais mais bem preparados (como o interessante personagem de Bill Paxton), que querem afastar aquele "abutre" amador das cenas de sangue e conflito.

E é num desses momentos de empurrões e desentendimentos que ele consegue capturar com mais precisão o resgate de um grave acidentado. Na espreita, ele procura saber a quem levar aquele tipo de filmagem, dirigindo-se, então, a uma emissora que estava no jogo do quanto mais chocante melhor. Logo no primeiro contato, ele conhece a diretora de um programa que procurava mostrar matérias sensacionalistas, vestindo um véu de jornalismo investigativo e de prestação de serviços sociais. Aquele mundo cão da TV...


Com esse material grotesco, ele consegue a atenção da diretora de TV Nina Romina (brilhantemente interpretada pela sempre bela Rene Russo), entrando num esquema de atração e disputa. Ela querendo cenas cada vez mais impactantes, ele querendo cada vez mais estrutura e apoio para crescer naquele ramo. Um alimentando o outro, um querendo devorar o outro. Nessa, os dois se dão bem. Porém, é exatamente nesse jogo que Nina descobre estar nas mãos do bobão. O longo discurso em que Gyllenhall, sem receio algum, propõe (exige!) um romance porque aquilo seria uma extensão de seu negócio, é de deixar qualquer um admirado com seu domínio de texto e gestos. Contudo, falta de escrúpulo por falta de escrúpulo, a proposta imoral, apesar de audaz e desrespeitosa, termina por não ser bem um risco para ela. Seria um vantajoso jogo de interesses, um romance entre picaretas (que merecia algumas cenas mais intensas, penso), uma armação de gato e rato.


O filme traz um debate interessante sobre o que o público, mesmo que inconscientemente, busca no jornalismo da TV. Existe, sim, uma grande parte de expectadores que tem um gosto maior pelos crimes e acidentes locais, deixando de lado as reportagens de abrangências nacionais e internacionais. Isso acontece muito no Brasil também.

Depois de tanta ousadia e de tantas demonstrações de mau-caratismo, terminamos por simpatizar (e até por torcer) pelo personagem de Gyllenhaal, pois sabemos que um tipo como aquele, depois de uma jogada tão bem articulada,  merece se sair bem (lógico que na ficção).

Uma pena não ter havido sequer uma indicação ao Oscar...

Recomendo sem ressalvas!







domingo, 18 de setembro de 2016

Ferris Bueller's Day Off



Curtindo a Vida Adoidado (Ferris Bueller's Day Off, 1986) se tornou um verdadeiro cult em meio a tantos filmes direcionados ao público adolescente nos anos 80. A ânsia por uma sequência foi grande, mas, assim como outras produções brilhantemente dirigidas por John Hughes, não houve uma continuação para aplacar o desejo de milhares de fãs.

Talvez tenha sido um grande acerto, uma vez que temos exemplos de filmes que se arriscaram em sequências e que não conseguiram sequer fazer sombra ao filme original.

O diretor John Hughes (1950-2009) soube retratar com maestria e impecável humor várias histórias dos adolescentes daquela década, conseguindo agradar a espectadores de muitos países e de diversas faixas etárias. 

Assim como Curtindo a Vida Adoidado, outros filmes de sucesso do diretor não tiveram continuações e, talvez por isto, eles tenham ficado tão bem guardados na memória de quem os assistiu. Gatinhas e Gatões (Sixteen Candles, 1984), com Molly Ringwald e Anthony Michael Hall, Clube dos Cinco (The Breakfast Club, 1985), com Judd Nelson, Emilio Estevez, Anthony Michael Hall e, mais uma vez, a musa teen Molly Ringwald, e o hilário Mulher Nota 1000 (Weird Science, 1985), com Anthony Michael Hall (de novo) e a super gata daquele momento Kelly LeBrock, todos dirigidos por Hughes, são bons exemplares de comédias adolescentes que ditaram regras para outras produções da época.



John Hughes ainda produziu e roteirizou dois filmes adolescentes que se tornaram referências no gênero comédia romântica de adolescentes: A Garota de Rosa-Shocking (Pretty in Pink, 1986), que transformou Molly Ringwald numa estrela dos anos 80,  e Alguém Muito Especial (Some Kind of Wonderful, 1987), com Eric Stoltz, Lea Thompson e Mary Stuart Masterson.

Entre todos esses pequenos clássicos, não há dúvidas de que Curtindo a Vida Adoidado se sobressaiu como um dos mais divertidos e perspicazes da década, conseguindo o feito de entreter o público do início ao fim, sem escorregar em cenas repetidas ou vazias. Com uma história leve e cheia de diálogos inspirados, o filme não envelheceu, mantendo com primor sua abordagem despretensiosa acerca de jovens peraltas, desencontros familiares e ambientes escolares enfadonhos. Podemos dizer também que foi um encontro acertado de pessoas e momento: protagonistas e elenco de apoio talentosos,  roteiro bem executado e, claro, um diretor sagaz .



Neste filme, Ferris Bueller (Matthew Broderick) é um adolescente esperto e muito cínico que se finge de doente para matar um dia de aula e passar uma tarde de aventuras com  sua namorada (Mia Sara) e seu melhor amigo, o descompensado Cameron (Alan Ruck). No entanto, a facilidade que ele tinha de enganar seus ingênuos pais não se aplicava em duas pessoas sedentas por desmascará-lo: a irmã ciumenta e problemática (Jennifer Grey, de Dirty Dance, 1987) e o diretor vilão e atrapalhado, eficaz e histrionicamente interpretado por Jeffrey Jones.





Como grande parte da jornada foi no improviso, Ferris passa por muitas peripécias, levando os três adolescentes a hilárias situações de fugas, calotes e disfarces, sem nunca comprometer o bom humor do protagonista. É quase um anti-herói que poderia ter caído na crítica negativa do público, mas o carisma de Broderick garantiram a Ferris Bueller um lugar de respeito entre os caçadores de aventuras de plantão. 





No decorrer dos passeios, o filme tem um momento antológico, no qual Broderick sobe num carro alegórico de uma parada alemã e dubla "Twist and Shout", dos Beatles, numa cena citada e lembrada com muito entusiasmo, até por quem não conferiu o longa na íntegra.




Recentemente, surgiu um teaser na internet que mostrava Ferris em sua vida adulta, o que causou certa especulação sobre uma retomada do projeto, porém, o vídeo tratava-se tão somente de uma campanha de marketing de um veículo Honda. Ainda assim, o vídeo reacendeu a probabilidade de um revival para Curtindo a Vida Adoidado, afinal, Matthew Broderick, em entrevista, desconversou sobre seu interesse na continuação do longa.

Diante da chama reacesa, bem que podiam produzir um Curtindo a Vida Adulta Adoidado, com um Ferris Bueller maduro procurando pelo amigo solteirão e hipocondríaco e pela ex-namorada Sloane, hoje casada e cheia de regras, para viverem mais um dia de aventura e ruptura nos compromissos.

terça-feira, 13 de setembro de 2016

007 - Operação Skyfall


Sean Connery, um ator do qual eu sou fã, foi uma excelente escolha para iniciar a saga do agente secreto criado por Ian Fleming. Como o famoso James Bond, de codinome 007, o astro provou seu talento e conduziu três filmes da série (um deles não faz parte da franquia oficial) com carisma e segurança. O ícone deixou sua marca ao imprimir um jeito debochado e paquerador no agente, sem, contudo, perder a elegância e a destreza necessárias à composição de um espião de primeira linha.

Ian Fleming não aprovou a escolha de Connery, um ator escocês, para interpretar o personagem, visto que o criador do agente queria o inglês Roger Moore para papel. Porém, Moore estava protagonizando uma série de TV de grande sucesso no momento, O Santo (The Saint, 1962–1969), e não teve chances de rescindir seu contrato televisivo. Descartado o santo, o escritor pediu que o papel fosse oferecido a Cary Grant, também inglês, alegando que este era mais requintado e tinha maior projeção no mundo cinematográfico. Mas os produtores foram firmes e contrataram Sean Connery para o ser o 007. Com o resultado do longa, a objeção deve ter se esvaído, pois o filme teve um estrondoso sucesso e rendeu uma arrecadação muito superior ao investimento.


Após Sean Connery, cinco atores já tiveram a proeza de interpretar o tenaz agente do serviço de espionagem britânico MI6 (Military Intelligence - Section 6): o australiano George Lazenby, que fez somente um filme; o inglês Sir Roger Moore, que embora bem sucedido, deu um tom mais leve ao personagem (e protagonizou cenas mirabolantes e difíceis de se acreditar); Thimothy Dalton, ator britânico nascido no País de Gales, que não brilhou, mas que também não foi um fiasco, e que não participou de um terceiro filme por ter se envolvido em projetos no teatro; Pierce Brosnan, um ator irlandês que só não entrou na frente de Dalton por estar comprometido com um trabalho de sucesso na TV (Remington Steel, 1982-1987), e que, na minha opinião, foi a melhor escolha após Sean Connery. O jeito cínico e elegante de Brosnan foi trabalhado de forma a tornar o herói terno e viril o bastante para seduzir as mulheres, como também ágil e seguro para lidar com os homens; e, por fim, o atual dono do posto, o inglês Daniel Craig, que apesar de ter dividido opiniões quando foi escolhido, deu um novo vigor ao herói e recuperou o desgaste que a franquia vinha sofrendo com os últimos filmes de seu antecessor.

Os filmes protagonizados por Sean Connery, hoje, figuram na galeria de clássicos ou de memoráveis exemplares do cinema, seja por cenas isoladas, seja por todo conjunto. Com relação ao único longa de George Lazenby, podemos considerar que ao menos foi uma história bem contada, com roteiro eficiente e um protagonista mediano. O problema é que as comparações foram inevitáveis, pois Lazenby substituiu um senhor ator e, apesar de ter sido convidado para o filme seguinte, não teve condições para repetir o papel. Com isto, Roger Moore, o queridinho de Fleming (já falecido nesta época), foi convidado novamente e pode aceitar o papel. E não é que o ator caiu no gosto do público? Por outro lado, embora tenha brilhado em grande parte do tempo, é incrível como os filmes protagonizados por Moore envelheceram; da mesma forma que os filmes de Timothy Dalton, um ator que esbanjou talento, ficaram datados.

Porém, nessas contradições da vida, foi o mesmo ótimo Pierce Brosnan que quase afundou a franquia do agente secreto galã.

O problema é que os dois últimos filmes protagonizados pelo ator foram para um lado difícil de se engolir, causando risos até em alguns fãs mais fervorosos da saga. 007 - O Mundo Não É O Bastante (The World Is Not Enough, 1999) não convenceu e 007 - Um Novo Dia Para Morrer (Die Another Day, 2002) ficou sofrível com a cena de surf na geleira derretida e com o carro invísível, sem mencionar que a bela e oscarizada Halle Berry só serviu para ser bolinada, jogada e capturada como a bond girl da vez.

Então, foi com grande surpresa e satisfação que recebemos as vigorosas mundanças na franquia com Casino Royale (idem, 2006), que substituiu Brosnan por Daniel Craig e empregou maior realismo nas cenas de luta. Conduzido pelo talentoso diretor Martin Campbell, que já tinha dirigido o ótimo 007 Contra Goldeney (Goldeneye, 1995), o novo filme reelaborou a conduta do herói e trabalhou cenas de ação que causaram bastante impacto, sem incorrer no ridículo dos dois últimos filmes de Brosnan.

Os fãs sempre criam expectativas ante a produção de uma nova aventura, que precisam trabalhar muito bem o vilão (um personagem que deve ser tão forte e empolgante como o herói), escolher com acerto a atriz que terá o privilégio de ser a bond girl (Eva Green - linda! - não quis ser chamada de bond girl, alegando que sua personagem não era uma mulher como as outras), trazer uma música tema empolgante (constantemente muito bem escolhida) e apresentar as surpresas tecnológicas que ajudarão o agente nos momentos mais apreensivos. Logicamente que o encaixe de cenas de ação impactante num bom roteiro também se revela como trunfos para o sucesso.


Apesar da controvesa escolha de Daniel Craig para o papel, é certo que o ator provou segurança e propriedades para encarar um dos melhores filmes do agente secreto James Bond. Sim, 007 - Operação Skyfall (Skyfall, 2012) foi um desafio para equipe de produção e para por em prova o talento do ator. Como alguém poderia imaginar o Bond, James Bond como um beberrão barbado, incapaz de acertar um tiro num alvo a poucos metros? Somente por meio de um roteiro bem elaborado, uma direção segura e uma interpretação visceral do protagonista.

Durante uma intensa perseguição, com direito a manobras automobilísticas de tirar o fôlego, o nosso herói se vê em cima de um trem em movimento,  numa luta mano a mano com um perigoso assassino profissional. Precisando recuperar um super importante pacote de dados cibernéticos, M. (de novo, a estupenda Judi Dench) ordena que a bela agente Eve (Naomi Harris) atire no inimigo antes que perca os dois de vista. Sem visão e segurança, a moça hesita e informa não ser possível acertar o alvo, mas M., numa tomada de decisão atroz, exige o disparo. Resultado: é o bom e velho Bond que leva o tiro, caindo do trem em movimento, rumo a um gélido e extenso rio.



Dado como morto, o MI6 (Military Intelligence - Section 6) inicia o processo de aposentadoria de M., em virtude da exposição que o roubo de dados estava promovendo no serviço, citando, muito sem real consideração, o incidente de Bond.

Diante de ataques cibernéticos e explosões pungentes, o herói retorna do limbo para ajudar sua arrogante chefe que, no fundo, tem uma relação especial com Bond. Não por acaso, numa cena muito interessante, ao ouvir o codinome da implacável senhora, o herói se refere a ela como bitch.

Despreparado, angustiado e sedento por vingança, James Bond parte para uma missão de perigo extremo, tendo de lidar com um dos melhores inimigos criados pela saga, o terrorista virtual Silva (um fenomenal Javier Bardem).




A história é longa e tem vários momentos de diferentes arranjos e concepções, condensando com boa dosagem de personagens ricos em suas dimensões, assim como cenários e locações aprazíveis. O filme dá um considerável destaque à personagem M., traz uma partner interessante para Bond e apresenta o o novo Q. da era digital. Acertados foram os momentos em que antigos filmes tiveram sutis homenagens.

Não tenham dúvida e confiram este exemplar  que certamente entrará para a lista dos melhores filmes do personagem criado por Ian Fleming.


Notas: (a) nem prestem muita atenção na bond girl de Bérénice Marlohe, pois a moça - bonita e exótica - entra e sai de cena sem deixar muita lembrança.
            (b) divirtam-se com a interpretação digna de um Oscar de Javier Bardem e não levem muito a sério tudo o que o personagem afirma.


            

The Ring

Existe uma corrente de cinéfilos que criticam a mania dos norte-americanos de promoverem adaptações de filmes de outros países que fizeram sucesso pelo mundo afora. Cheguei a ler que isso se deve à preguiça dos cidadãos dos Estados Unidos de lerem legendas e à falta de inspiração dos grandes estúdios para produzirem filmes com um bom argumento. E as críticas vão além: a s refilmagens de longas originados em países de língua não inglesa estão apresentam resultados muito ruins. Os remakes (com alteraçãos para atender o estilo hollywoodiano) têm como fontes os filmes de sucesso de países como o Japão, a Tailândia e a Espanha.
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Como exemplos, temos: "O Grito" (The Grudge , USA, 2004) e sua deprimente continuação, refilmagem de "Ju-On - O Grito" (2000); "O Olho do Mal" (The Eye, USA, 2008), com Jessica Alba (provando que é realmente bonita e péssima atriz), refilmagem de "The Eye - A Herança" (2002); "Imagens do Além" (Shutter, USA, 2008), refilmagem do ótimo "Espíritos - A Morte Está ao Seu Lado" (2004); e "Uma Chamada Perdida" (One Missed Call, USA, 2008), refilmagem de "Chakushin Ari" (2003). Os remakes mencionados acima nos apresentaram filmes inferiores aos originais e, em alguns casos, verdadeiras bombas, o que me leva a sugerir que as pessoas procurem assistir aos longas que serviram de base para o produto norte-americano. Acho que serão mais felizes.
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E notem que os filmes originais nem são tão antigos e poderiam ter sido distribuídos dignamente no país, sem a necessidade de um alto custo para uma versão fraca.
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Felizmente nem todas as versões norte-americanas ficaram ruins, uma vez que temos sido presenteados com gratas surpresas como "Água Negra" (Dark Water, USA, 2005), com a ótima Jennifer Connelly, sendo uma refilmagem de "Honogurai Mizu No Soko Kara" (2002); "Vanilla Sky" (Vanilla Sky , USA, 2001), um filme bom, embora inferior ao original espanhol "Abre los Ojos" (1997) e "O Silêncio do Lago" (The Vanishing, USA, 1993), refilmagem de "Spoorloos" (1988), da Holanda. Eu tenho ciência de que os dois últimos citados foram "condenados" pela crítica especializada, mas ficaram bastante razoáveis e renderam bons comentários de muitos que os assistiram.
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Mas vamos ao que interessa:
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Diante dessa introdução, quero me referir a um filme que marcou a trajetória de filmes de terror e trouxe um diferencial para os fãs do gênero: o excelente "O Chamado" (The Ring, USA, 2002). A prova disso é que, logo após o grande sucesso dessa refilmagem, a quantidade de filmes que tentaram copiá-lo foi absurda e descarada, chegando ao ponto de produzirem (gastando dinheiro) filmes toscos e risíveis.
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À exceção do excelente "Os Outros" (The Others, USA, 2001), estávamos sendo invadidos por uma bateria de produções que entraram na onda dos sucessos das franquias de "Pânico" (Scream), mas sem a inteligência deste, que sabia brincar consigo mesmo, de "Lenda Urbana" (Urban Legend) e "Eu sei o que vocês fizeram no verão passado" (I know what you did last summer), ressucitando até a franquia de "Halloween", e passando por aqueles filminhos que mostravam vários jovens atores nos cartazes de divulgação, como o chato "Alucinação" (Soul Survivors, USA, 2001), o mediano "Comportamento Suspeito"(Disturbing Behavior, Australia, USA, 1998) e o aceitável "Prova Final" (The Faculty, USA, 1998).

Nesse cenário, surgiu "O Chamado", uma produção caprichada e bem divulgada que rompeu com os estilos que predominavam para um filme de terror, valorizando o aspecto psicológico, a dúvida e a sugestão. É claro que a produção norte-americana não conseguiria deixar de usar o que seus cidadãos adoram: efeitos especiais e sons altos nos momentos de impacto, o que não teve no original "Ringu" (1998).

Com direção de Gore Verbinski (de "Piratas do Caribe"), que até então só havia dirigido o "A Mexicana" (um filme sem muita prosperidade), um curta-metragem e o infantil "Um Ratinho Encrenqueiro", e distribuído pela DreamWorks (de Steven Spielberg e cia), "O Chamado" despertou interesse logo que a inteligente campanha de marketing começou a divulgá-lo.
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É certo que houve algumas modificações do original japonês de forma a torná-lo mais próximo dos espectadores ocidentais, mas a trama foi mantida por ser muito boa (se não fosse, é claro que não haveria um remake norte-americano). A história começa com duas garotas (caracterizadas como típicas adolescentes dos Estados Unidos) que estão sozinhas na casa de uma delas e que chegam ao assunto de uma lenda urbana que rezava sobre uma maldição em torno de uma fita VHS. A fita tinha um conteúdo muito estranho e quem a assistia recebia uma ligação que sussurrava "sete dias". Com esse prenúncio, a pessoa estava amaldiçoada e iria morrer no prazo mencionado.
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Katy (Amber Tamblyn - que protagonizou o ridículo "O Grito 2"), uma das garotas, fica assustada, pois, há uma semana, ela esteve com o namorado e um casal de amigos num chalé e assistiu a uma fita muito estranha que estava no acervo do local. Rebecca (Rachael Bella), a outra garota, ri e conta que tudo não passava de bincadeira, de uma lenda urbana. Mas nessa mesma noite, algo tenebroso acontece com Katy. O que no original japonês é só insinuado, havendo um corte no momento crucial, na versão americana, há um número maior de detalhes, sem, contudo, revelar o que causou a morte de Katy.
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Calma! O que eu escrevi é só o início do filme. No funeral de Katy, sua mãe (Lindsay Frost ) se mostra indignada, querendo entender o que faria uma garota de 16 anos morrer do coração e apresentar uma expressão de puro pavor no rosto, enquanto sua amiga Rebecca enlouquece e é internada num hospital psiquiátrico, entrando em estado catatônico.

A partir de então, inicia-se o enigma de "O Chamado", entrando em cena a prestigiada e linda atriz Naomi Watts (foto acima). Interpretando a repórter Rachel Keller (papel recusado por Jennifer Connelly, Gwyneth Paltrow e Kate Beckinsale - as duas primeiras até poderiam se dar ao luxo de recusar, mas a terceira...), Watts dá um tom dramático e dinâmico para sua personagem, o que trouxe um ótimo diferencial para o filme. Uma grande profissional que soube dar crédito às situações absurdas apresentadas na produção graças à sua seriedade e competência.
Rachel é tia de Katy e, durante o funeral, acaba ouvindo a conversa de algumas garotas sobre as coincidentes mortes trágicas dos três companheiros que tinham ido ao chalé com sua sobrinha (o namorado e o casal de amigos). Intrigada, Rachel resolve investigar a situação e se depara com uma história assustadora que pode comprometer a sua vida e a de seu filho Aidan (David Dorfman), um menino sensitivo que já havia previsto a morte de Katy.
Com incidência de sons muito bem acertados e um cuidadoso trabalho de fotografia, "O Chamado" envolve o espectador do início ao fim, causando uma sensação de ansiedade, medo e uma grande curiosidade para saber o que há por trás daquela fita VHS.


Completando o elenco, além do ator em ascensão Martin Henderson (de "Fúria em Duas Rodas"), temos os veteranos Brian Cox e a sempre agradável Jane Alexander (de "Kramer vs. Kramer").


Não foi por acaso que a angelical e bonitinha Daveigh Chase (foto acima) ganhou o MTV Movie Awards, na categoria de Melhor Vilã, por ter dado vida à estranha e malévola Samara Morgan, um dos trunfos do filme. Destaque para um grande momento: a seqüência do cavalo furioso na balsa que, diante da proximidade de Rachel, sente o prenúncio da maldição, tornando-se um animal feroz e incontrolável que chega a romper a sua cela de proteção. É uma das cenas mais assustadoras do filme, embora o público eleja outras como aquelas que os deixaram com medo de dormir.

Algo que ficou interessante na versão norte-americana foi o título do filme. Em vários momentos, um círculo é mostrado (de forma explícita ou subliminar), o que poderia ser um anel (ring), uma aliança, um simbolo de ligação; no entanto, ring, no idioma inglês, também serve para os toques telefônicos. No filme, aqueles que chamam as vítimas para ouvir a mensagem fatal... Seven Days! Desta forma, criou-se um dubiedade na interpretação do que seria "The Ring". Tanto que o cartaz norte-americano do filme traz a seguinte mensagem: "Before you die, you see", ou seja, não é "ouvir" como no pôster em português.

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Não posso deixar de comentar um ponto destoante: "O Chamado", talvez pela diferença de tempo da produção norte-americana com a japonesa, nos apresenta uma modernidade (grandes televisões de plasma - provavelmente com conversor digital integrado, HDTV, conexões HDMI e USB, celulares pequenos, computadores avançados, equipamentos de captura de imagens etc) que contrasta com a fita VHS, o objeto principal do filme, afinal, são poucos os que ainda têm seus aparelhos de video cassete instalados em casa...
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Segue abaixo o conteúdo da fita VHS que determinava a morte de quem assistia. Mas não se assuste se, ao terminar de assistir, você receber uma ligação com uma voz sussurrante, dizendo: "seven days".

segunda-feira, 12 de setembro de 2016

Suspense, Sustos e Loiras Surpreendentes

Janet Leigh

O que as loiras acima têm em comum com a estrela Janet Leigh?

ATENÇÃO: ESTA POSTAGEM POSSUI SPOILERS SOBRE OS SEGUINTES FILMES:

“Psicose” (Psycho, USA, 1960), “Vestida Para Matar” (Dressed to Kill, USA, 1980), “Pânico” (Scream, USA, 1996), “O Ente Maldito” (The Ghol, UK, 1975), “A Hora do Pesadelo” (Nightmare on Elm Street, USA, 1984), “Sexta-Feira 13″ (Friday the 13th, USA, 1980 e “O Corte da Navalha” (Razorback, Australia, 1984).
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Além do fato de também serem (ou estarem) loiras e de terem atuado em bons filmes do cinema, elas foram apresentadas ao público como a (suposta) protagonista da produção, mas encerraram suas participações em pouco tempo da projeção, passando o bastão para outras atrizes.

O mestre do suspense Alfred Hitchcock foi o cineasta que mais brilhou nessa jogada de induzir o público a um enredo e chocar toda uma platéia ao eliminar a “protagonista” após alguns minutos do filme. A façanha foi apresentada no clássico “Psicose” (Psycho, USA, 1960) e serviu de inspiração para vários outros diretores. Neste filme, a tarefa de assumir o papel da mocinha da história ficou a cargo da não menos talentosa e também loira Vera Miles.




Ainda que as outras produções não tenham atingido a importância de "Psicose", a idéia, em alguns casos, foi até bem aplicada, conseguindo criar o inevitável incômodo no público.

Em questão de impacto, o que mais se aproximou do clássico de Hitchcock foi o filme de seu assumido discípulo Brian De Palma. Em “Vestida Para Matar” (Dressed to Kill, USA, 1980), o diretor fez alarde com a volta triunfal da estrela da série de TV Police Woman, a belíssima Angie Dickinson, prometendo cenas picantes com a recatada loira, da mesma maneira que o Mestre do Suspense fez com Leigh (embora com muito mais discrição). E não é que Brian De Palma fez o mesmo com a personagem da atriz? A substituição da heroína ficou a cargo da também loira Karen Allen.



Quando do lançamento do filme “Pânico” (Scream, USA, 1996), dirigido pelo renomado Wes Craven, os cartazes de divulgação nos fizeram pensar que a loirinha Drew Barrymore seria a protagonista do filme. Em entrevista de divulgação do longa, a jovem atriz (não sabemos se ingenuamente) jogou por terra toda uma jogada (sem trocadilho) de marketing ao dizer que não queria antecipar muito sobre as surpresas do filme, mas que ela estava se “sentindo uma Janeth Leigh, uma Angie Dickinson…”. Os cinéfilos entenderam o recado. Desta vez, a substituição da protagonista ficou a cargo da bela morena Neve Campbell.



Querendo copiar ou não o grande mestre, o filme inglês “O Ente Maldito” (The Ghol, UK, 1975) conseguiu a façanha de fazer o público acreditar e torcer para que a personagem Angela, interpretada pela sensual Veronica Carlson (loira, sexy e envolvente!!!), desvendasse o mistério da mansão gótica no meio de uma floresta. Entretanto, a “inocente” garota não sabia que estava prestes a ser eliminada numa cena inusitada. Nessa produção, a quase ruiva (quase sempre loira em outros filmes) Alexandra Bastedo (suave no início e completamente histérica ao final) fez a vez da mocinha substituta.

 


Falando de substituição de loiras por quase ruivas, o diretor Wes Craven (olha ele aqui de novo!!!) já havia feito essa mesma jogada antes de seu filme “Pânico”. Em “A Hora do Pesadelo” (Nightmare on Elm Street, USA, 1984), ele nos apresentou a linda Amanda Wyss como a garota que iria conduzir o público ao longo desse grande sucesso do cinema, mas o tenebroso Fred Kruegger (Robert Englund), talvez para já mostrar aos espectadores que não estava para brincadeiras, atacou a mocinha e mudou o rumo da história. A ruivinha Heather Langenkamp assumiu o jogo e partiu para o ataque (ou para fuga).



Sean S. Cunningham dirigiu a bonitinha Adrienne King em “Sexta-Feira 13″ (Friday the 13th, USA, 1980), a jovem ingênua que sobrevive ao massacre e que consegue liquidar a malévola Pamela Voorhees (Betsy Palmer). Risível e depreciado por alguns, é inegável que o filme se tornou um grande sucesso e suas continuações foram a prova de que a franquia fora (ou ainda é) promissora. A inevitável seqüência, que introduziu o assassino Jason Voorhees, anunciou que a loirinha sobrevivente do primeiro filme estaria de volta. Mas eis que a produção, dirigida por Steve Miner, resolveu dar um susto na platéia com a eliminação da gorota (King) logo na primeira cena da parte 2. A substituta loira, em papel muito parecido com o de Adrienne, foi Amy Steel.



Com “O Corte da Navalha” (Razorback, Austrália, 1984), o diretor Russell Mulcahy trouxe ao público um filme acima da média na proposta e na condução inicial do enredo, valorizado por uma fotografia muito bem cuidada. Já estávamos intrigados com a investigação sobre uma devassa mostrada logo no início do longa e acostumados à corajosa repórter Beth Winters, vivida com sobriedade pela charmosa Judy Morris (loira), quando algo monstruoso faz um estrago geral e nos deixa simplesmente atônitos. O ator Gregory Harrison, que faz o marido da personagem de Morris, assume o posto central do filme e vai ao local da tragédia para saber notícias de sua desaparecida esposa, recebendo a ajuda da loirinha da vez, a bonitinha Arkie Whiteley.


O Mestre do Suspense deixou seu legado e outros cineastas conseguiram fazer bons filmes com essa idéia de surpreender o público com a eliminação da protagonista, no entanto, até o momento, ninguém conseguiu superar a importância de Alfred Hitchcock no estilo suspense, tampouco desbancar a performance do ícone Janet Leigh.